Não vamos levar o Brasil nas costas

O que está por trás da onda de xenofobia pós-eleição?

Oi, tudo bem?

O Nordeste entrou novamente no centro do debate eleitoral, depois da virada de votos de Lula (PT), que liderou nos nove estados. Não demorou para que ataques ganhassem força nas redes. A onda de xenofobia foi protagonizada por apoiadores de Bolsonaro, que ressuscitaram um velho preconceito contra os eleitores da região. 

Nesta edição, a jornalista pernambucana Alice de Souza* explica como ataques xenofóbicos se repetem  e aprofunda a análise sobre “o voto nordestino”. Alice também adverte contra a construção da imagem do Nordeste como salvador desta eleição.

A gente concorda com Alice. Não vamos levar o Brasil nas costas, mas vale se inspirar no exemplo nordestino. Vamos em frente e Lula presidente!

Sirva-se!

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O Nordeste não vai levar o Brasil nas costas

Por Alice de Souza*

Entra eleição, sai eleição, a gente está aqui, cascavilhando os votos do Nordeste. Como se fosse uma novidade, um evento extremo, parte do Brasil parece fascinada com a ideia de lembrar aos demais algo até meio óbvio para quem é daqui - Lula (PT) costuma levar a maioria dos votos na região. Não que isso seja uma exclusividade nossa, vide o histórico do PSDB em São Paulo, mas as lentes - e os haters - pós-eleição presidencial sempre se voltam pra gente!

O mais comum dos movimentos, uma fita que parece enguiçada, vem em forma de xenofobia. A mesma história nos últimos pleitos presidenciais. Quem aí lembra de Mayara Petruso, a estudante de direito condenada por postar mensagens preconceituosas contra nordestinos no Twitter, após o segundo turno de 2010? 

O mesmo aconteceu em 2014, 2018 e se repete em 2022. A onda sempre vem. Neste ano, Lula teve 12,9 milhões de votos a mais na região, frente ao presidente Bolsonaro. O petista perdeu no Sul, Sudeste e Centro-oeste, em comparação ao atual comandante do executivo nacional.

Xenofobia pós-eleição no Nordeste não é fenômeno do “Bolsonarismo”. A insistência em nos diferenciar e diminuir como povo, a partir de uma suposta superioridade intelectual e moral, é um movimento cíclico, expressão atemporal da falta de conexão do próprio brasileiro com a realidade nacional. Basta só uma oportunidade - e a eleição sempre é - para reaparecer, com as mesmas roupagens. 

A imprensa sudestina segue ajudando nisso, basta dar um Google buscando por “Lula + voto + Nordeste” para ver as manchetes alardearem: Nordeste dá 1º lugar a Lula, Crescimento de Lula se deve ao Nordeste e não a voto útil,  ‘Nordeste será decisivo para vitória de Lula no 1º turno’, diz governador de Pernambuco, entre outras.

Na Cajueira, já mostramos como o estigma de que nordestino não sabe votar está atrelado, na verdade, a uma desqualificação do voto dos pobres. Diz mais sobre classismo, elitismo e manutenção de poder do que sobre nuances políticas do país. Afinal, como lembra esse sempre atual fio da jornalista Fabiana Moraes, as imagens de um Nordeste autônomo não interessam.

E se ao invés de correr para dizer que o Nordeste pesa a favor de Lula, nos questionássemos o que pesa a favor de Bolsonaro em outras regiões? Lavajatismo, políticas favoráveis à destruição do meio ambiente, aceno ao agronegócio… A votação é plural em todos os territórios, há muitos motivos para definir um voto, até mesmo nesse lugar Nordeste que costumam chamar de “rincões”.

Nem todas as capitais do Nordeste deram vitória à Lula, nem mesmo no meu grupo de cinco amigos do colégio, no Recife, todo mundo vota no petista. Imagina nos meandros de 1.793 municípios de nove estados…

Se a gente não aprofundar essa análise, vamos ficar sempre no raso e perder o bonde da história passando. Afinal, como lembra a jornalista Beatriz Jucá, se Nordeste votasse só pelos programas assistenciais de transferência de renda, o Auxílio Brasil teria feito um estrago grande nesse “irrestrito” apoio ao ex-presidente agora candidato. 

Bora aprofundar esse debate e conhecer, de fato, o peso do Nordeste nas eleições 2022? Deixo aqui uma sequência de links interessantes!

Ah, e não me venha com o lenga-lenga de “o Nordeste vai salvar o Brasil”, “O Nordeste carrega o Brasil nas costas”... Ele serve tanto quanto o suposto elogio aos sotaques daqui, nada. Assuma seus B.O.s! Como lembrou a nossa leitora Tatianne Dantas, bora ouvir os cientistas políticos daqui? Aprender por que o Bolsonarismo aqui não se cria? Fazer do Nordeste um celeiro de dicas e estratégias para vencer o bolsonarismo parece mais útil do que explorar discursos ultrapassados e preconceituosos.

Para te inspirar, começo com este fio de Nayara Felizardo, mostrando que além do alto percentual que Lula teve no Nordeste, a região garantiu bons nomes para o Senado e derrotas importantes no bolsonarismo. 

Também trago uma análise pós-primeiro turno das Cunhãs para quem quer uma perspectiva nordestina sobre o pleito nacional misturada com uma análise da conjuntura nos estados da região.

Quer entender a composição legislativa nordestina após as eleições? A Agência Tatu mostra que 41% dos deputados federais eleitos no nordeste são novos parlamentares. Conheça quem são eles.

Mas como nem tudo são só flores, aqui também temos espinhos. A Bancada federal de Pernambuco, conta a Marco Zero, continua conservadora, com nomes tradicionais e agora tem até negacionista do direito ao aborto legal.

Para finalizar a nossa conversa, e inspirar vocês neste segundo turno, venho aqui com a única certeza que tenho sobre essa região tão diversa, a gente não foge à luta. Se você estiver com dúvida do que fazer no domingo 30, conheça dona Santú, que aos 83 anos iria até a China, se preciso fosse, para depositar o voto dela na urna!

*Alice de Souza é jornalista, especialista em Direitos Humanos e mestre em Indústrias Criativas. Atua na Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji). É integrante da RedLATAM Distintas Latitudes e fellow Climate Tracker. Foi fellow da International Women's Media Foundation (IWMF) e repórter do Diario de Pernambuco. É Jornalista Amiga da Criança, pela Andi Comunicação e Direitos. 

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